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O uso estratégico do recurso público para impulsionar a inovação nas cidades.


Peças de xadrez
Peças de xadrez

O uso estratégico do recurso público para impulsionar a inovação nas cidades.


Introdução: a escassez como ponto de partida


Em praticamente todos os países, mas sobretudo na América Latina, o debate sobre uso do recurso público é marcado por um paradoxo. As cidades convivem com enormes carências estruturais em saúde, educação, saneamento, mobilidade e habitação, enquanto prefeitos e prefeitas enfrentam pressões por entregas rápidas e visíveis.


O que está em jogo, no entanto, não é apenas onde gastar, mas como investir. A inovação, muitas vezes vista como luxo, é na verdade infraestrutura invisível: cada real aplicado pode multiplicar valor ao atrair investimentos privados, gerar empregos, formar talentos e reduzir custos operacionais. A mudança de mentalidade — do gasto imediato ao investimento estratégico — é a chave para reposicionar as cidades no século XXI.



O falso dilema: infraestrutura tradicional versus inovação:


Quando se discute orçamento público, a comparação é inevitável. Um quilômetro de asfalto ou um programa de aceleração de startups? Construir uma nova escola ou investir em formação de professores e inovação pedagógica?


Dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) mostram que obras de infraestrutura urbana consomem milhões de dólares por quilômetro. Embora gerem impacto político imediato, o retorno econômico se esgota na própria obra.


Em contrapartida, políticas de inovação — embora menos visíveis no curto prazo — têm efeito multiplicador:


• O BID estima que a América Latina perde bilhões por ano em valor não capturado dos resíduos sólidos. Políticas de economia circular podem transformar esse passivo em receita, reduzindo custos de aterros e gerando empregos verdes.

• A CAF aponta que cada dólar investido em energias renováveis pode gerar até quatro dólares em benefícios econômicos, entre empregos, eficiência e redução da dependência de fósseis.

• O Fórum Econômico Mundial (WEF) calcula que congestionamentos podem consumir até 4% do PIB das metrópoles, reforçando que mobilidade inteligente é também política econômica.

• A OCDE demonstra que cada ano adicional de escolaridade de qualidade aumenta em até 10% a produtividade do trabalho. Educação inovadora não é despesa: é o maior investimento em competitividade que uma cidade pode fazer.


Portanto, o dilema não é entre asfalto ou inovação. É entre gastar em soluções de retorno limitado ou investir em iniciativas que multiplicam valor.



Inovação como multiplicador de impacto: cinco experiências:


1. Singapura – Smart Nation


Em 2014, o governo lançou a iniciativa Smart Nation, destinando recursos à digitalização dos serviços, sensores urbanos e inteligência artificial.


• Investimento público: bilhões em infraestrutura digital.

• Resultados: mais de 95% dos serviços do governo hoje online, redução de custos administrativos e aumento da eficiência.

• Impacto: Singapura consolidou-se como hub asiático de inovação, atraindo empresas globais e capital estrangeiro.


2. Hyderabad (Índia) – T-Hub e Startup India


O Estado de Telangana estruturou o T-Hub, hoje a maior incubadora de startups da Ásia.

• Investimento público: apoio em governança, espaço físico e incentivos.

• Resultados: centenas de startups apoiadas e atração de investidores internacionais.

• Impacto: criação de nova matriz econômica e empregos qualificados em tecnologia.


3. Gravataí (Brasil) – Ecossistema de Startups:


No Rio Grande do Sul, Gravataí aplicou R$ 2 milhões em um programa de inovação com metodologia clara de aceleração.


• Investimento público: R$ 2 milhões.

• Resultados: 60 startups aceleradas; 25% delas já faturando acima de R$ 1 milhão ao ano.

• Impacto: atração de R$ 25 milhões em investimentos de grandes empresas para o ecossistema local, mostrando retorno superior a 12 vezes o valor aplicado.


4.Encantado (Brasil) – Educação como motor de desenvolvimento


No interior do Rio Grande do Sul, Encantado não ampliou o orçamento de educação (mantendo os 25% constitucionais), mas reprogramou e inovou na aplicação.


• Investimento público: dentro dos limites legais.

• Resultados: salto de 50 posições no IDEB, criação de empregos via educação integral e avanço expressivo nos índices de aprendizagem.

• Impacto: demonstração de que inovação em políticas educacionais gera retorno social e econômico mesmo sem aumento de gastos.



Coragem política: investir no invisível


Uma avenida inaugurada rende aplausos imediatos; um hub de inovação ou um programa educacional transformador exigem tempo para mostrar frutos. Esse descompasso entre tempo político e tempo da inovação explica a resistência de muitos gestores.


Mas prefeitos que ousam investir em inovação provam que o retorno compensa. Gravataí e Encantado são a prova viva de que não é preciso aumentar o orçamento, mas usá-lo de forma estratégica. O que muda não é a quantidade de recursos, e sim a inteligência com que são aplicados.



Conclusão: inovação como infraestrutura invisível


Estradas se desgastam, prédios envelhecem. Mas ecossistemas de startups, professores inovadores e alunos com aprendizagem qualificada se valorizam ao longo do tempo.


O desafio para prefeitos e prefeitas é mudar a pergunta central: não apenas “quanto custa?”, mas “quanto retorna?”.


Quando inovação é tratada como investimento estratégico, ela se torna a infraestrutura invisível que multiplica prosperidade econômica, inclusão social e sustentabilidade. E os exemplos de Singapura, Hyderabad, Reggio Emilia, Gravataí e Encantado mostram que esse futuro já está acontecendo — basta coragem para segui-lo.

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